Na certa você já conviveu, mesmo que não de muito perto, com episódios severos de sofrimento mental. Um daqueles pacotaços que costumam nos apresentar com o carimbo de loucura. Primeiro impulso mais usual, acionado pela família, até por amigos: negar, disfarçar, maquiar as aparências. O tempo, ele mesmo, o sempre implacável, se encarrega de demonstrar a infelicidade, mesmo a imbecilidade de tal gesto. No passado talvez não houvesse alternativa ou saída, obrigando a tais terríveis gestos. Hoje, a exclusão social ou familiar do doente mental é ação da mais requintada covardia, do mais vil desleixo. Coisa que a ignorância não justifica, mesmo que possa amenizar.
Glória Perez é mestre na difícil arte das telenovelas, e, dentro delas, mestre na abordagem de temas delicados, conseguindo aí manter reduzido o grau de apelação e baixaria. Coisa de quem sabe fazer, de quem consegue, deixando de lados recursos manjados, espalhar sementes de reflexão e de compaixão no sofá, na mesa, e mesmo na cama de dezenas de milhões de brasileiros. Sei que não é bonito tê-la, mas confesso minha inveja. As novelas servem doses cavalares de xarope, mas servem também fortificantes e vitaminas. Elas chacoalharam, e empurraram adiante, a história cultural de nossa pátria grande e boba, mas isso é outro assunto, com choros próprios.
Esse papo todo visava apenas registrar as emoções trazidas pelo personagem Tarso, vivido com extraordinário talento pelo ator Bruno Gagliasso em "Caminho das Índias", e registrar, ainda, a delicadeza com que Glória Perez - como se emprestando uma lupa a cada espectador - nos conduz à intimidade de um surto e de todo o drama que o cerca. A cena partilhada ontem por Tarso, em crise nos confins de seu quarto, e por sua irmã, interpretada pela Maria Maya, foi arrasadora. Perdi o fôlego (artigo que anda em falta por aqui), dividi com a Katinha umas lágrimas sem vergonha.
Perdi essa cena, Paulão, mas assisti uma em que um gato preto sai do teto e achei fantástica (me lembrou os contos de terror do E.A.Poe). A relação que a autora faz entre as castas indianas e a realidade brasileira é bem legal, didático e vitamínico, é como se os "loucos" daqui fossem os "dalits" de lá. São ambos intocáveis, a "poeira na sola dos nossos pés"! Mas discordo como a novela mostra os psicopatas, acho a personagem daquela tetéia da sabatela xarópico e inverossímil, tanto quanto a família indiana que dança para ir no banheiro. Abraço!
ResponderExcluirNo básico, concordo com sua discordância. Quero ver a Sabatela quando a coruja piar, por enquanto ela é um convite a ser psicopatiado. Dançar para ir ao banheiro é até tolerável, dependendo do aperto. Dura é a vida de famílias daqui, extra novela, que dançam para ir ao médico e à escola, tudo ao ritmo da marchinha "Bobeou, dançou", tocada nas melhores filas a partir das duas e meia das matinas. Torço para que seu galo perca de pouco... abração.
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