Reflexões e memórias de um diferente... e quem não é? E por assim ser, senhoras e senhores, o que lhes apresentar? Esse blOg dEfiCIenTe. Em verdade, vai aqui a retomada de um velho blog,adormecido há dois anos.
terça-feira, 29 de dezembro de 2009
Bom era quando os imortais só cochilavam nas Academias
sábado, 26 de dezembro de 2009
Sobrevivemos

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009
Luzes na boca do beco

terça-feira, 22 de dezembro de 2009
Lembranças não são pensamentos

Faz tempo.
quinta-feira, 17 de dezembro de 2009
quarta-feira, 9 de dezembro de 2009
Somos singulares
Não aprende não, meu amigo, inclusive porque essa é uma péssima forma de se aprender. E veja, se acontecer com eles, eles não serão mais eles, serão nós. E o cachorro louco volta a correr atrás do rabo. A esperança de uma transformação democratizante e inclusiva está, em parte, em instituições e em leis que nos apresentem no palco como cidadãos, mas está também, e principalmente, num paciente trabalho educativo. Trabalho capaz de expandir e infiltrar uma consciência de apreço e respeito às diferenças, uma consciência de que somos todos diferentes, mais que isso, singulares (o que nada tem a ver com individualismos). Trabalho que, por exemplo, você e a Rede SACI vêm desenvolvendo com maestria.
Somos singulares. A deficiência física é apenas um aspecto da vida de algumas pessoas, você, eu, Tchela, João, Maria, Abigail, Severino etc, e estamos até na moda: com a isenção de impostos para a compra do carrinho 0 Km tem muita gente nova tentando provar que sempre foi do clube. Somos todos singulares, andantes, muleteiros e cadeirantes, surdos e ouvintes, cegos e videntes, feios e bonitos, etc e tal, e, portanto - e isso é material para outros bons papos! -, não cabe falar em normalidade. E gosto de brincar com a idéia de normalidade, sempre a vejo como a realidade e os valores que são próprios aos dominantes e aos poderosos, e que eles tentam provar, por meios pacíficos ou não, que são a realidade e os valores de todos.
No outro texto, eu tratava de um deficiente que não existe, uma entidade quase abstrata. Ele só existe se conseguimos imaginar o somatório, e a junção, de parcelas das vidas de todos aqueles que têm a deficiência física como um dos aspectos de suas existências. Meio complicado, né? Quando falamos, por exemplo, nos deficientes físicos brasileiros, ou nos cegos do mundo, ou nos tetraplégicos de Guarulhos, estamos, ao mesmo tempo, falando de todos os concernidos e de ninguém. Você trouxe a voz do deficiente real, com desejos, raivas, esperanças, essas coisas, e eis o que mais importa, é aí que se dá a luta ou desânimo, a inserção ou a exclusão. Um deficiente passional, contraditório, querendo ser feliz, e que põe vida no meu "deficiente teórico", digamos assim, que é uma mera concepção, mas é útil por nos ajudar na tentativa de compreender as questões que não podem ser analisadas apenas sob o olhar e os interesses de um ou outro deficiente específico.
Está ficando meio longo, né? Vamos mais um pouquinho, prometo resumir. Wright Mills foi um cientista social que viveu nos meados do século passado, e foi um cara que sempre iluminou minhas singelas tentativas de compreender o mundo e a vida social. Ele dizia que a vida real, os fatos sociais, se explicam como cruzamentos da biografia com a história. É de alto risco tentar simplificar isso numa conversa assim rápida, mas vamos lá. As pessoas que vivem numa sociedade, maior ou menor, num determinado tempo histórico partilham esse painel de fundo, sobre o qual suas biografias se exercem, e só assim suas vidas poderão ser compreendidas Brinquei com essa idéia quando, no outro texto, afirmei que meu primeiro sentimento, por não ter nascido numa tribo do Xingú, era de alívio. E se o tivesse, minha biografia, na certa, seria curtinha, por imposição de um painel histórico, e cultural, em vigor.
Falemos da Tchela, nossa querida amiga comum. Ela prepara um livro onde descreverá um claro exemplo: a história de uma mulher deficiente física que seguia vivendo sua vida (biografia) quando, em determinado momento, dá de cara com o computador e a Internet (possibilidades históricas). O encontro redireciona sua própria vida, e vai nascendo daí uma escritora. Tivesse ela, ao se casar, mudado para um pequeno vilarejo, talvez o mundo visse surgir, dessa conjunção, uma boa doceira, uma requintada bordadeira, e eu não teria tido o imenso prazer de conhecê-la, mesmo que só virtualmente.
Ainda a Tchela, e que ela me perdoe pelo uso e pelo abuso do exemplo. No Maré, seu concorrido blog(http://tchela.blogspot.com/), ela nos encanta com pedacinhos bem contados de sua vida. Em algum momento das últimas décadas do século passado, ela (biografia) se encontra com o seu Benê (biografia), um homem que, por algum motivo biográfico, desenvolveu a liberdade pessoal e a segurança que não lhe impediram de se apaixonar por uma mulher numa cadeira de rodas. E tal fato foi possível por eclodir num tempo histórico em que um tal relacionamento é tolerado, talvez até aprovado. Tivesse tal amor desabrochado em famílias japonesas lá, mas também aqui, e o sofrimento estaria encomendado. Não sei se ainda hoje, mas até pouco tempo, numa família japonesa mais tradicional, a filha deficiente não poderia se casar e reproduzir, e, com freqüência, condenaria suas irmãs ao eterno celibato. E me deu grande saudade da querida Sueli, e fazem tantos anos que não a vejo, uma filha de japoneses, uma inteligência privilegiada que pôs a nocaute uma paralisia cerebral que se meteu em seu caminho.
Renato, peço a você, e ao eventual leitor, uma última gota de paciência. Contarei mais um pequeno episódio meu, tentando reforçar a idéia de que falar de deficientes é falar de pessoas específicas, com histórias específicas, que têm a deficiência como um aspecto que marca suas vidas de forma mais ou menos determinante, conforme o caso. E que cada caso só será compreendido percebendo-se como foram se construindo as possibilidades ou impossibilidades de uma vida, num determinado tempo histórico.
Chego eu na porta de um restaurante. Estaciono meu carro meio chic, cinza, automático, ano 2000, me transfiro para a cadeira de rodas e sigo em frente com minha mulher e meu filho, ambos aparentemente saudáveis e felizes. Por atração de estranho magnetismo, meus olhos se cruzam com os de um moço que, em surrada cadeira de rodas, vende chicletes no sinal (farol ou semáforo, em outras plagas). Negro, pobre, deficiente, maltratado pela vida. Pensei, de relance: "se ele for analfabeto e gay estará fechado o círculo da exclusão mais cruel e impiedosa". Tento um sorriso. Ele balança a cabeça, sem aliviar a tensa rigidez do rosto. Sinto o seu olhar percorrendo aqueles 30 ou 40 metros que nos separam, e sinto que, em alguma proporção que não consigo precisar, ele me contempla com uma expressão de admiração e mágoa, talvez uma pontada de ódio. Ele empinou a cadeira, deu meia volta e se afastou por entre os carros. Naqueles parcos segundos, ele não acreditaria, talvez pensasse em deboche, eu o invejei. Invejei suas habilidades com a cadeira, sua coragem pessoal, sua luta, que imaginei obstinada, pela sobrevivência.
Éramos ambos deficientes físicos, mas os outros aspectos ou faces de nossas respectivas existências haviam criado aquele abismo imenso. A solidariedade entre nós, para se estabelecer, teria que vencer vários obstáculos. A deficiência nos teria identificado não fossem tão opostos nossos mundos. Um dia desses, talvez, nos encontremos numa manifestação pelo rebaixamento das calçadas, ou na campanha de algum político deficiente físico, ou com base nas entidades representativas dos deficientes. O importante, Renato, é que se continue lutando pelas causas dos deficientes, esses entes envolvidos por direitos e deveres, mas que não percamos de vista um fato: eles só serão atraídos para a luta comum se sentirem os movimentos como capazes de penetrar e reordenar as próprias e específicas biografias.
sábado, 28 de novembro de 2009
Olha o juízo, moçada!!!
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
Cuidado, tem cocô na pista
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
Melhoras no estado geral
terça-feira, 10 de novembro de 2009
Muros da memória
quinta-feira, 5 de novembro de 2009
Não é só na Venezuela
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
Essa grande mulher
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Não deu lá, vai aqui...
terça-feira, 13 de outubro de 2009
Dá-lhe Geléia... chega de silêncios...
sábado, 10 de outubro de 2009
Abrace essa causa
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Me jogaram na rede...
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Humores do vento
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
Enquanto isso, no dia do idoso...
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
Deficiências na memória
Memórias. Corria o ano de 1981. O general Figueiredo governava o Brasil, distribuindo coices e promessas de abertura política. A economia transitava entre o milagre e a nova crise que se desenhava. Casado havia três anos, e com a carreira de professor bem encaminhada, eu não gastava esforços com pessimismo ou queixas. Minhas energias pareciam bem distribuídas, os focos estabelecidos. Mas, quem controla a própria vida? O amanhã só tem graça por estar sempre prenhe de surpresas. "Previsível de verdade só a morte", insinua a sabedoria popular.
Já desisti de tentar saber a origem primeira do convite que, naquele ano distante, iria bulir com minha existência e meus interesses. Fui convidado para dar uma palestra no grande evento que marcaria aquele como o ano internacional das pessoas com deficiência, promovido pela ONU e outras entidades. O evento seria realizado no monumental, mas hoje finado, Hotel Nacional, no Rio de Janeiro. Aceitei por instinto, a tremedeira deixei para depois. Porque eu? De deficiente eu só tinha a longa, e bem sucedida prática (modéstia à parte). Nunca sistematizara, ou fizera teoria, sobre o que este aspecto secundário de minha vida impusera à minha consciência e à minha sensibilidade. O tema que me encomendaram era algo como "barreiras arquitetônicas" e urbanísticas com que se deparam os deficientes. A ansiedade quase que só me deixou rabiscar umas idéias gerais.
O tempo correu lépido e distraído. Logo eu estava lá, instalado num luxuoso apartamento com vista para a praia de São Conrado. O Centro de Convenções, no próprio hotel, parecia um aeroporto internacional ou a portaria da ONU: gente de todo tipo, línguas e roupas para qualquer gosto. De cara, fui atacado pela pulga atrás da orelha: tinha deficiente de menos naquela festança. Não estaríamos os deficientes aptos, ou preparados, para expor nossos planos e experiências? Mas logo eu descobriria que realmente não estávamos. Desde a abertura dos trabalhos, ficou claro que o clima de tutela seria preponderante, e não por malvadeza ou picaretagem dos organizadores, mas porque simplesmente não havia, naquele tempo, outro caminho. Um pensamento "dos" deficientes só foi construído daí para frente, e duramente.
Vi duplicada minha responsabilidade. Eu estava condenado a fazer bonito na minha apresentação, talvez pelo fato de que eram raros os deficientes palestrantes (e, no caso, eu ainda me supunha um palestrante deficiente). Eu sentia muitos olhos me examinando, por vezes curiosos. Então chegou minha hora, no segundo ou terceiro dia do Encontro. Calculei minha cara mais inteligente, enverguei a camisa nova, segurei junto à muleta a pasta com minhas anotações, e lá fui.
No grande auditório não havia cadeira vaga. No palco, havia uma longa mesa ornada, ainda vazia, mas com os microfones já a postos. Encostei-me perto da porta, nervos controlados, aguardando socorro da intuição. O coordenador abriu a sessão, fez algumas considerações, e, logo, passou a convocar os palestrantes que, se não me engano, seriam quatro naquela tarde. Chamou o primeiro, logo depois o segundo. Eu seria o próximo, mas um calor se antecipou em meu peito. A intuição se intrometeu, me dando a grande pista. Bingo!!! Ouvi meu nome e desloquei-me em direção ao palco. Olhei, de um lado, a escada. Caminhei até o outro extremo. Escada também. Lá de baixo, ao nível das cadeiras, dirigi-me ao coordenador e disse algo assim: "em reverência política ao ano consagrado aos deficientes, e em protesto contra a falta de adaptação de um ambiente com tal destinação, vou me recusar a ser carregado. Estou reivindicando a descida da mesa para este nível, como ato simbólico de apoio à causa e às necessidades dos deficientes físicos". Evidentemente, essa foi uma fala emocionada, e sem a clareza bem articulada que aqui se apresenta com a escora da escrita e a auto-complacência da memória.
Um desajeito no ar, algum constrangimento, e logo aplausos e palavras de apoio. Muitos se apresentaram para ajudar na mudança da mesa e dos equipamentos. Criara-se um clima interessante, bom para se plantar coisas novas. Senti que tinha acertado num alvo que eu ainda não conseguia distinguir. Esse gesto também ativou em mim o impulso de militância. Eu que tinha tido até então, aqui e acolá, uma persistente mas discreta militância política, pressentia que nova frente de luta se abria naquela hora. Deficientes, seus direitos, sua cidadania, tais coisas dariam estofo para boa e digna luta? Ali tive certeza que sim, e sem planejar, me dispus a ela, dentro de minhas parcas possibilidades.
Duvido que alguém tenha saído daquele auditório mais tocado do que eu mesmo. Usei o ocorrido como gancho, e palestrei com o coração, com uma história que eu não suspeitava contida ali dentro. Contatos, trocas de endereços, os primeiros convites para encontros e outras palestras. Topei a briga, fiz do verbo a arma, circulei e falei muito nos 15 anos que se seguiram. Durante um bom tempo o episódio da mesa que desceu vinha à tona quando me apresentavam num evento ou numa reunião. Mais recentemente, quando a saúde andava trôpega, sobreveio desânimo e ceticismo. Falar mais o quê? Para quem? Meu tempo passou, soava clara a sentença. Mas o tal veneno é perene em seu contágio. Foi a conta de abrir um pouco a guarda, com a descoberta do blog, e ele se infiltrou sem disfarces. E me deixa aqui, assim, meio menino, brigando pela atenção de cada caro leitor.
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
De coronel e demagogo, todo mundo tem um pouco
Charme materno
Quando o tempo parece não passar
quinta-feira, 10 de setembro de 2009
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
O povo adora ele
Outro dia, faz pouco, na portaria da clínica, enquanto as pupilas não se adequavam aos tamanhos exigidos pela doutora, estiquei a conversa com o porteiro solícito e de conversa boa. A vista já não conseguia decifrar o jornal repleto de previsões sobre a iminente queda do Palocci. E de fato, horas depois ele tombaria, puxado pelo tamanho e peso do nariz pinocchiano. Disse o porteiro, fala mansa, fino analista:
- “Estão querendo derrubar o Lula. Não adianta, o povo adora ele. Nem se derrubarem o Palocci, o Lula cai.”
Atiçado pela firmeza do comentarista político de balcão, tentei saber mais, enquanto a doutora não me chamava. Perguntei:
- “E o PT, como fica?”
Retrucou ele, sem pestanejar:
-“Nem me fala, moço, é igualzinho os outros. Está cheio de ladrão, de cara que só quer o dele...”
Interferi:
- Mas o Lula é do PT?”
Ele, sem perder o rítmo, sentenciou:
- “O Lula não está nem aí pra eles, ele não precisa. É o povo que vai dar a reeleição para o Lula. O senhor gosta dele?”